Nada pior para um músico do que se tornar proselitista político. E pouco importa sobre o que ou para quem milita. A consequência inevitável é distanciar parte – por vezes, considerável – do seu público e se impor uma limitação criativa que o aliena da própria vocação. E, se um dia ousar passear por outras paragens, permitindo-se transcender ou descansar de seu ativismo, acaba por espantar e distanciar o público que lhe ficou fiel.
Um excelente exemplo disso é Caetano Veloso. Em sua turnê atual, ao lado de Maria Bethânia, incluiu a canção evangélica Deus Cuida de Mim, do pastor Kleber Lucas. Segundo o próprio Caetano disse em entrevista: “Essa é a única canção que não recebe aplausos entusiasmados. E isso não me surpreende. Para a maioria do público que vai ver Bethânia comigo, o interesse pelo assunto ‘igrejas evangélicas’ não é algo esperado nem desejado. Mas eu sei que pode criar conversas que não costumam se dar”
“Não é algo esperado nem desejado”. Mas não foi sempre assim. Na carreira de Caetano, músicas com temática religiosa não são incomuns, independentemente de suas crenças pessoais. Já em seu primeiro disco como artista solo, de 1967, temos Ave-Maria, cuja letra nada mais é do que a oração a Nossa Senhora, em latim, retrabalhada e embalada em ritmo abrasileirado. No disco de 1975, há Escapulário, samba que trabalha criativamente uma poesia de Oswald de Andrade com a oração do Pai Nosso: “No pão de açúcar/ De cada dia/ Dai-nos, Senhor/ A poesia de cada dia”.
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